Empoderamento Feminino

Grandes atitudes começam pequeninas

Por Jean Sigel

Como pai procuro observar atentamente minhas duas filhas e suas peripécias no auge de suas infâncias. Não necessariamente apenas por ser um pai zeloso, mas por ser curioso e gostar de me envolver com o dia a dia delas,  saber o que aprenderam de novo, o que têm para contar e o que descobriram para que compartilhem seus sonhos e dúvidas. Acredito que nessa fase da primeira infância é importante a presença próxima do pai e da mãe para acompanhar o desenvolvimento dos pequenos e o que captam essas mini-super-esponjas ambulantes que são as crianças de 0 a 8 anos de idade.

É nesse período da vida que elas aprendem as primeiras lições ligadas a valores de família: moral e ética, princípios, respeito, solidariedade entre outros valores humanos fundamentais. Mas também é a fase em que a criatividade e a arte de realização estão em seu estado mais puro e intenso. Crianças nessa faixa etária espontaneamente criam, fantasiam, brincam e inovam livremente a cada gesto, cada desenho, brincadeira, pergunta ou sapecagem. Elas são autênticas e originais em seus desejos e realizações, não tem medo do erro e muito menos do pré-julgamento ou preconceito alheio. São verdadeiramente criativas e curiosas pelo inédito, o belo, o diferente e o divertido. Experimentam o novo, jogam e depois criam as regras, ou vice versa, mas não deixam de jogar, pois não tem medo de jogar com o outro e simplesmente fazem acontecer.

Em uma ocasião fiquei feliz com uma iniciativa da minha filha mais velha, Giulia, na época com 6 anos. Em um domingo ela ganhou um anel rosa de brinquedo de uma amiguinha e ficou encantada com o presente e com o gesto. Era um anel grande com água e brilhos dentro. Dormiu com ele e no dia seguinte queria por que queria leva-lo para escola para mostrar aos amigos. Toda animada lá foi ela. No mesmo dia, na volta pra casa lá vem a Giulia toda cabisbaixa e com olhar de quase “desespero” pois havia perdido o anel rosa em algum lugar na escola. Procuramos por tudo, nos achados e perdidos e nada. Dissemos pra ela que no outro dia procuraríamos mais e que ela deveria continuar perguntando para amigos e professores. E ao mesmo tempo, ficar lamentando não resolveria o problema e ela precisaria fazer algo. Não se ganha nada no grito, mas sim com esforço”, digo a ela a partir de um ensinamento que tive de meu pai e avô, coincidência ou não, ambos empreendedores. Mas também disse que caso não o encontrássemos ela teria que superar e encarar que por um descuido ou acaso, havia realmente perdido. Teria que virar a página e seguir adiante. A vida tem dessas coisas.

Pois bem, um dia se passou e novamente nada de encontrar o anel. E quando achávamos que ela já estava desistindo da procura, eis que ela surge com uma iniciativa que me surpreendeu. Ela sentou-se a mesa e como gosta muito de desenhar, teve a ideia fazer vários desenhos do anel com seu formato grande, rosa e com água dentro com a seguinte mensagem – Anel Perdido –  e pequenos descritivos – “ele é rosa, tem brilhos e água”, etc. Colocou seu nome para as pessoas identificarem e também pediu o meu número de telefone para colocar nos tais bilhetes. Resultado, ela pegou fitas adesivas e espalhou os papéis em vários cantos da escola, nas árvores, parquinhos, próximos as salas, banheiros, para que os demais alunos e toda a escola pudessem se envolver e ajudá-la a encontrar. Foi comentário geral de todos as tais mensagens da Giulia espalhadas pela escola e no dia seguinte ela me liga eufórica e diz: “Papai, adivinha? Acharam meu anel e está aqui comigo agorinha”, com um ar de felicidade fresca contagiante.

Regras para os pequenos são extremamente importantes, assim como limites e sistemas, mas com a mesma importância deveriam ser tratados a liberdade de criação, a tentativa e erro livres,  a beleza do diferente, o brincar, o exercício da independência e autonomia, a expressão da personalidade e da atitude.  Infelizmente vejo muitos pais fazendo exatamente o contrário, assim como muitas escolas. Ou seja atribuindo demasiado valor a regras, ordens, disciplina, super lotando agendas dos pequenos e negligenciando o que as crianças têm de essencial – seu poder de criação. De acordo com a idade e sob a supervisão dos pais é claro, crianças pequenas podem e devem ter o direito de fazer pequenas coisas por conta própria, como refletir e corrigir um erro que cometeu, levar o prato do almoço para a cozinha, ajudar os pais a escolher as frutas do mercado de maneira divertida ou até assumir uma posição diante de um problema da família.

Essa pequena atitude de uma menina de 6 anos, como deve ocorrer com tantas outras crianças nesta idade, me deixou contente, primeiro por ela acreditar que ainda encontraria aquele anel, por não desistir facilmente dele e depois pela capacidade de ter a ideia de mobilizar outras pessoas para encontrá-lo. Penso que atitudes espontâneas como essa ajudam os pequenos a enfrentar problemas e buscar soluções ao seu modo, do seu jeito, dando-lhes confiança própria de que podem fazer qualquer coisa e fazer diferente.

Está aí algo que o mundo corporativo tanto busca atualmente. Pessoas com capacidade de criação aliada a força de realização e de engajar outras pessoas. Engajar não apenas pela necessidade mas pelo significado. Um singelo exemplo como esse pode inspirar marmanjos a fazerem o mesmo em seus trabalhos, e também aos pais e escolas a estimularem iniciativas criativas e empreendedoras desde muito cedo. É  importante que o ambiente também proporcione condições para que atitudes de confiança como essa floresçam, seja no ambiente de casa, na escola ou na empresa. Se naquele exato momento em que a Giulia teve a ideia de espalhar pequenas mensagens por toda a escola, nós pais ou mesmo a própria escola inibíssemos ou proibíssemos a iniciativa por razões diversas, talvez no mesmo instante estaria desaparecendo aos poucos aquela criança criativa e realizadora, dando lugar talvez a um futuro adulto com medo de tentar, inovar e empreender.

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