Filho de mulher que trabalha fora devia nascer criado, sair da maternidade direto para a faculdade, pois ele não deixaria de ser seu filho e você, de quebra, não se sentiria tão culpada em dividir a atenção entre ele e o trabalho. Assim resolveria o problema da cobrança que sempre recai sobre nossa cabeça: Sou boa mãe? Boa profissional? O que sou? O que faço?
Fonte da imagem: MorgueFileFree
Quando nós decidimos ter filhos, são tantas coisas a serem consideradas, que ao final de tudo você está confusa e com dúvida se suas escolhas foram realmente as melhores. Se você optou por babá para ficar com seu filhote, quando sai de casa vai cheia de grilos, será que a babá é mesmo confiável? E é normal retornar para casa e involuntariamente procurar por manchas no filho, indagar, questionar, etc. Se a escolha foi escolinha, você sempre vai se sentir um ser espacial toda vez que aquele portão colorido “engolir” seu filho. Não existe preparo psicológico que resiste a isso, e se ele for grandinho e chorar na despedida então, é o fim para qualquer estrutura de mãe. A vontade que vem é de se agarrar a ele e fugir dali para sempre.
Sem contar que em qualquer escolha que você fizer sua mãe e os demais tios e tias vão palpitar. Falarão coisas horríveis sobre babás ou escolas e, no final vão indagar se realmente não daria para você ficar com a criança pelo menos até ficarem maiores, porém é claro que ninguém irá se oferecer para pagar as suas contas.
Então, você já sabe que essa é a sina de mãe que trabalha, com pais coadjuvantes, porque embora eles sejam presentes, os maiores cuidados são sempre da mãe, portanto não se iluda que terá ajuda em tempo integral, que ele irá cancelar aquela reunião para buscar o pequeno na escola para você e sua equipe resolver algo importante, porque ele não vai. Ele é apoio sim, para as horas vagas, para o bebê sorridente, mas se estiver doente, com febre, com fralda para trocar, esqueça, a menos que o seu companheiro seja feito de outro material e tal receita foi jogada fora. No geral, é assim mesmo a história.
Todas essas coisas são reais para qualquer mulher que trabalhe fora, que tem jornada dupla, agora, somamos isso a uma mulher empreendedora e vemos que a situação não muda muito, a única coisa de bom é que não temos que comprovar falta em papel, mas somos consumidas com a mesma culpa, com as mesmas dúvidas e criamos nossos filhos à base do “depois de”. Depois de responder esse e-mail, depois de desligar esse telefonema, depois de terminar esse orçamento, depois de a produção se for, e é assim que vamos tocando a nossa vida de mulher empresária e não menos atarefada que as demais.
Eu mesma trabalhei muitas vezes com meus filhos (tenho dois) depois de eles chegarem da escolinha, eles iam para a empresa porque eu tinha de adiantar trabalho e sempre acabavam dormindo debaixo da mesa na produção ou no escritório. Ali mesmo comiam, brincavam e dormiam, o chão embaixo da mesa se tornou uma brinquedoteca, quando enjoavam, muitas vezes dormiam sem tomar banho mesmo. Só lá pelas tantas que íamos para casa e eu exausta ainda tinha de desempenhar minha função de mãe.
Meu maior pânico era a escola ligar para dizer que algum deles estava com febre. Então fui sempre cuidadosa e policiava ao máximo para que eles não cometessem excessos e ficassem doentes, porque aí tudo ficava mais difícil. Quem iria buscá-los na escola? Quem ficaria com eles? No final, eles adoeciam do mesmo jeito e ficavam comigo na empresa o tempo todo até se recuperarem.
Agora eles já cresceram um pouco e não ficam doentes com tanta frequência, são crianças compreensivas, reagem bem ao “a mamãe está trabalhando”. Se toda essa maratona ira afetá-los, só o futuro dirá e só lá também que correremos atrás do prejuízo, porque agora tenho uma empresa para gerir, que eles gostando ou não, é o que faço, é o meu trabalho e o que paga nossas contas.
Ser mãe é a melhor coisa do mundo, é fabuloso, mas penso que essa função tinha que ser única e tratada com toda a atenção, porque os mais afetados com essa história toda somos nós, pois vemos impotentes o tempo passar e de repente nossos filhos indo para faculdade e sem que percebamos eles já não precisam mais de nós, restando apenas o gosto amargo que toda essa ausência trouxe e o que ela também levou.
Será que ao misturarmos maternidade e trabalho decretamos a nossa solidão no futuro? Arrebentamos a corda da sequência do amadurecimento e entregamos ao mundo crianças precoces e sem ilusão? Ou a entupimos de brinquedos frívolos para compensar nossa ausência, favorecendo a futilidade, o imediatismo e a perda de valores bases da convivência social?
São muitas perguntas sim, muitas mesmo, para as quais não saberemos as respostas agora e talvez nunca saibamos. O importante é se entregar de corpo e alma nessa jornada, dando o seu melhor, toda sua força. E quem sabe quando lá na frente você encarar seu filho diplomado ou não, ele seja um adulto íntegro, bom, o que fará com que todas essas angustias, dúvidas e dor, de hoje, sejam recompensadas.
Ao trabalho!
Semíramis Cordeiro é sócia da empresa Ponto de Evidência Soluções Gráficas. Formada em Marketing, Publicidade e Propaganda. Especialista em Empreendedorismo pela FGV/Goldman Sachs, através do projeto “10.000 Mulheres Empreendedoras do Mundo”. Possui o blog: palavrasdase.blogspot.com.