Por André Bartholomeu Fernandes
Nota do editor: Este artigo ganhou o prêmio no 2014 Annual Awards Contest do Deadline Club, the New York City chapter of the Society of Professional Journalists.
Ninguém disse que construir uma empresa era fácil. Mas é hora de ser honesto sobre como isso pode ser brutal – e sobre o preço alto que os empreendedores pagam por isso
Por todos os aspectos, Bradley Smith é um empreendedor de sucesso inquestionável. Ele é CEO da Rescue One Financial, uma empresa de serviços financeiros na California que fechou o ano de 2012 com 32 milhões de dólares em vendas. A empresa de Smith cresceu mais de 1400% nos últimos 3 anos, estando na posição 310 da Inc. 500 desse ano. Dito isso, você não deve imaginar que, há exatos 5 anos atrás, Smith estava à beira da ruína financeira e do colapso mental. Em 2008 Smith estava trabalhando longas horas aconselhando clientes nervosos sobre como sair da dívida.
Mas o seu comportamento calmo e mascarado tinha um segredo: ele compartilhava de seus medos. Como seus clientes, Smith foi afundando em mais e mais dívidas. Ele estava bem perto do vermelho – em todos os sentidos. Eu estava ouvindo o quão deprimido e viciado meus clientes estavam, mas no fundo eu estava pensando comigo mesmo, eu tenho o dobro da dívida desse cara, lembra Smith.
Ele havia estourado a sua linha de crédito de 60 mil dólares. Ele havia vendido seu Rolex que havia comprado com o seu primeiro salário na sua carreira anterior de corretor. Ele se humilhou diante de seu pai, o homem que acreditava em máximas como, “dinheiro não dá em árvores” e “não se faz negócios com a família”, pedindo emprestado 10 mil dólares emprestado, valor que só recebeu após assinar uma promissória com juros de 5%.
Smith projetou otimismo aos seus co-fundadores e 10 funcionários, mas seus nervos estavam em frangalhos. Minha esposa e eu gostaríamos de dividir uma garrafa de vinho para o jantar, mas apenas nos entreolhamos lamentando tudo. Nós sabíamos que estávamos perto do abismo.
Em seguida, a pressão ficou ainda pior: o casal descobriu que estava esperando seu primeiro filho. Eles ficaram noites sem dormir, olhando para o teto. Smith acordava às 4h da manhã, preocupado, pensando sobre a situação e se perguntando quando é que as coisas iriam acontecer.
Após 8 meses de ansiedade constante, a empresa de Smith finalmente começou a ganhar dinheiro.
Para quem gosta de empreendedorismo, os empreendedores bem sucedidos têm status de herói em nossa cultura. Nós idolatramos Mark Zuckerberg e Elon Musk. E comemoramos o crescimento incrivelmente rápido das empresas na Inc. 500. Mas, muitos desses empreendedores, como Smith, carregam seus demônios secretos: antes de se tornarem grandes empreendedores, eles lutaram para superar esses momentos de ansiedade quase debilitante e desesperadores, em que tudo parecia desmoronar.
Até recentemente admitir esses sentimentos era um tabu. Em vez de mostrar a vulnerabilidade, os líderes têm praticado o que os psiquiatras chamam de gerenciamento de impressão, ou o ‘minta até conseguir – fake it till you make it‘. Toby Thomas, CEO do EnSite Solutions, empresa 188 na Inc. 500, explica o fenômeno com sua analogia favorita: um homem cavalgando em um leão.
As pessoas olham para ele e pensam: esse cara realmente tem colhão. Ele é corajoso. Mas o homem montado em um leão está pensando: como diabos eu vim parar em cima de um leão, como eu faço para evitar ser devorado?
É como um homem cavalgando num leão. As pessoas pensam: “Esse cara é corajoso”. E ele está pensando: “Como eu vim parar em cima de um leão e como eu faço para ele não me devorar? “ Nem todo mundo que caminha pela escuridão passa por ela. Em janeiro, o conhecido fundador do e-commerce Ecomom tirou sua própria vida. Sua morte abalou a comunidade startup. Ela também reacendeu a discussão sobre empreendedorismo e saúde mental, que começou há 2 anos após o suicídio de Ilya Zhitomirskiy, de 22 anos, co-fundador da Diaspora, uma rede social.
Ultimamente mais empreendedores começaram a falar sobre suas lutas internas na tentativa de combater o estigma sobre a depressão e a ansiedade que faz com que seja difícil para os doentes procurar ajuda.
Em um post profundamente pessoal chamado “When Death Feels Like a Good Option”, Ben Huh, CEO ds site de humor Cheezburguer escreveu sobre seus pensamentos suicidas após o fracasso de uma startup em 2001.
Sean Percival, ex-vice-presidente do MySpace e co-fundador da startup de roupas para crianças Wittlebee, escreveu um post chamado, “When It’s Not All Good, Ask for Help”, em seu site.
Eu estava a beira do abismo e quase desisti de tudo no ano passado por conta da depressão e da pressão sobre negócio. Se você está prestes a desistir, por favor contate-me.
Eu estava a beira do abismo e quase desisti de tudo por conta da pressão sobre meu negócio. CLICK TO TWEET
Brad Feld, diretor executivo do Foundry Group, começou a blogar em outubro sobre o seu mais recente episódio de depressão. O problema não é novo – o capitalista de risco proeminente lutou com transtornos de humor durante toda a sua vida adulta.
Mas então vieram os e-mails. Centenas desses e-mails. Muitos eram de empreendedores que também lutaram com a ansiedade e com o desespero.
Se você visse a lista de nomes, seria uma grande surpresa. Eles são pessoas muito bem-sucedidas, muito carismáticas e cheias de visibilidade. Mas ele têm lutado em silêncio. Há uma sensação de que eles não podem falar sobre isso, que é uma fraqueza ou vergonha. Deixar a coisa escondida e presa, torna tudo pior.
Se você é empreendedor, tudo isso pode acabar soando familiar pra você. É um trabalho estressante que pode criar turbulência emocional. Para começar há o grande risco do fracasso.
A estatística afirma que, 3 em cada 4 startups fracassam, de acordo com uma pesquisa feita por Shikhar Ghosh, um professor da Harvard Business School. Ghosh também constatou que mais de 95% das startups ficam aquém de suas projeções iniciais.
Os empreendedores muitas vezes conciliam muitos papéis e enfrentam inúmeros contratempos: clientes perdidos, disputas com parceiros, aumento da concorrência, problemas de pessoal, etc., tudo ao mesmo tempo. Para complicar as coisas, os novos empreendedores muitas vezes tornam-se menos resistentes por negligenciar a sua saúde. Eles comem demais ou muito pouco. Eles não dormem o suficiente.
Por isso não deve ser nenhuma surpresa o fato de empreendedores experimentarem mais ansiedade do que seus empregados.
Na última Gallup-Healthways Well-Being Index, 34% dos empreendedores se declararam preocupados, 4 pontos a mais do que os outros trabalhadores. E 45% dos empreendedores disseram que estavam estressados, 3 pontos a mais do que os outros trabalhadores.
Mas, pode ser muito mais do que apenas um trabalho estressante que empurra os empreendedores para o abismo. Segundo pesquisadores, muitos empreendedores compartilham traços de caráter inato que os tornam mais vulneráveis às oscilações de humor.
As pessoas que tem esse lado cheio de energia, motivado e criativo são mais prováveis de se tornarem empreendedoras e mais propensas também a terem estados emocionais fortes.
Esses estados podem incluir depressão, desespero, desesperança, sensação de inutilidade, perda de motivação e pensamento suicida.
O fracasso pode despertar pensamento suicida nos empreendedores.
Os empreendedores são vulneráveis para o lado negro da obsessão, sugerem os pesquisadores da Swinburre University of Technology in Melbourne, na Austrália. Eles realizaram entrevistas com fundadores de um estudo sobre a paixão empreendedora. Os pesquisadores descobriram que muitos empreendedores tinham sinais de obsessão clínica, incluindo forte sentimento de angústia e ansiedade.
John Gartner, psicólogo que leciona na Johns Hopkins Medical School reforça essa mensagem. Em seu livro, “The Edge Hypomanic: The Link Between (a Little) Craziness and (a Lot of) Success in America, Gartner afirma que um temperamento muitas vezes negligenciado pode ser responsável tanto por alguns pontos fortes dos empreendedores como por pontos fracos.
Não importa o seu perfil psicológico, grandes problemas no seu negócio podem abatê-lo. CLICK TO TWEET
Mark Woeppel, fundador da Pinnacle Strategies, uma empresa de consultoria de gestão de 1992. Em 2009, o telefone simplesmente parou de tocar. Por conta da crise financeira global, seus clientes estavam de repente mais preocupados com a sobrevivência do que em aumentar a produção.
Suas vendas despencaram 75%. Woeppel demitiu seus funcionários. Em pouco tempo, ele havia exaurido seus bens: carros, jóias, tudo que tinha. Sua confiança foi diminuindo também.
Como CEO você tem essa autoimagem de que é o senhor do universo. Aí, de repente, você simplesmente deixa de ser.
Woeppel parou de sair de casa. Ansioso e com pouca autoestima, ele começou a comer muito e engordou 50 quilos. Às vezes ele procurava um alívio temporário em um antigo hobby: tocar guitarra. Trancado em um quarto, ele tocava Steve Ray Vaughan e Chet Atkins.
Por isso tudo, ele continuou trabalhando no desenvolvimento de novos serviços. Em 2010, os clientes começaram a voltar. A Pinnacle fechou o seu maior contrato com uma fabricante aeroespacial, com base em um whitepaper que Woeppel havia escrito durante a sua crise.
Ano passado, a receita da Pinnacle atingiu 7 milhões de dólares. As vendas cresceram mais de 5000% desde 2009 e a empresa ganhou destaque esse ano ficando em 57º lugar na lista da INC. 500. Woeppel diz que agora é mais resistente, por conta da maturidade adquirida em tempos difíceis. Eu costumava pensar que eu era o meu trabalho. Mas aí você fracassa. E, descobre que seus filhos ainda te amam. Que sua esposa ainda te ama. Seu cão ainda te ama.
Alguns ferimentos da jornada empreendedora não cicatrizam facilmente.
Esse foi o caso de John Pope, diretor executivo da WellDog, empresa de tecnologia e energia. Em dezembro de 2002, Pope tinha exatamente 8 dólares em sua conta no banco.
Ele estava 90 dias atrasado na parcela de seu carro, 75 dias atrasado no pagamento de sua hipoteca. A Receita Federal entrou com uma execução contra ele. Seu telefone celular e TV acabo tinham sido desligados. Em menos de 1 semana a empresa de gás natural iria suspender o serviço na casa que vivia com sua esposa e filhas.
A sua empresa estava esperando uma transferência bancária da Shell, um investidor estratégico que, depois de meses de negociação terminou com um contrato de 380 páginas assinado. Então Pope esperou.
Desde então a WellDog decolou. Nos últimos 3 anos, as vendas cresceram mais de 3700%, passando para uma receita de 8 milhões de dólares, colocando a empresa na posição 89 na Inc. 500. Mas o resíduo emocional dos anos de tumulto ainda perdura.
Há sempre aquela sensação de estar sobrecarregado, de que não podemos relaxar nunca. Você acaba com um grave problema de confiança. Você sente que toda vez que construir a sua segurança, algo vem e leva embora.
Embora o caminho empreendedor seja sempre um caminho selvagem, cheio de altos e baixos, há coisas que os empreendedores podem fazer para ajudar a manter suas vidas fora de uma espiral fora de controle. Quando se trata de combater a depressão, o relacionamento com amigos e familiares podem ser armas poderosas. E, não deve se ter medo de pedir ajuda.
Freeman também aconselha que os empreendedores devem limitar a sua posição financeira. Quando se trata de avaliação de risco, os pontos cegos dos empreendedores muitas vezes são grandes o suficiente para causar prejuízo. As consequências podem agitar não apenas a conta bancária, mas também os níveis de estresse. Portanto, defina um limite para o quanto de seu próprio dinheiro você está preparado para investir.
A capacidade de reformular o fracasso e a perda podem ajudar os líderes a manter uma boa saúde mental. Em vez de dizer a si mesmo eu fracassei, o meu negócio fracassou e, eu sou um perdedor, olhe sob uma perspectiva diferente. Quem não arrisca, não petisca. A vida é um constante processo de tentativa e erro. Não exagere seus sentimentos.
Por último esteja aberto sobre seus sentimentos. Máscaras não ajudam as suas emoções. Quando você está disposto a ser emocionalmente honesto, você pode se conectar mais profundamente com as pessoas ao seu redor.
Este artigo foi adaptado do original, “The Psychological Price of Entrepreneurship”, da Inc.